quinta-feira, 3 de julho de 2008

A VACA DE SUTIÃ


Quando eu era menino, gostava de ajudar minhas irmãs na difícil arte de namorar no sertão. As visitas eram sempre aos domingos à tarde, salvo motivo de paixão maior, e uma das minhas atribuições era ir até à curva da estrada que dava para a minha casa, esperar os namorados, que vinham sempre à cavalo. Quando algum apontava ainda bem longe, eu voltava correndo para avisar e assim dar tempo às pretendidas para trocarem de roupa, tirarem os pitós e grampos dos cabelos e aquela horrível máscara branca de pomada Minâncora que elas carregavam o dia todo na cara e diziam que era para embelezar a pele. Tinha que dar tempo também, e isso era extremamente importante, de recolherem as peças de roupas íntimas, combinações, espartilhos, califons (hoje sutiãs), calções, calçolas e aqueles paninhos higiênicos que elas usavam quando sangrava o bode, que eram pendurados para secar na cerca de melão-de-são-caetano que rodeava a casa, e que não podiam, em hipótese alguma, serem vistos pelos cerimoniosos cavaleiros, sob pena de quebra de decoro e de serem motivo de constrangimento e vergonha. Visita de surpresa, nem pensar. Era um perigo, um deus-nos-acuda.
Uma vez, não sei por qual motivo, o namorado da minha irmã mais nova achou de vir sem avisar, no meio da semana, e o meu serviço de informação e alerta falhou feio.Tinha que falhar. Nada pude fazer. Quando me dei conta, o cavaleiro já estava parado no terreiro, apeado e dizendo o ô de casa. O corre-corre foi grande e apesar de todos os cuidados o moço, sem querer, acabou vendo a namorada em roupa de diária, cabelos desgrenhados e, ainda por cima, com a ridícula máscara de que já falei. Até aí, tudo bem. O rapaz esperou pacientemente até que a donzela se emperiquitasse e finalmente o casalzinho sentou-se no banco do terreiro. Foi aí que a minha irmã notou que várias peças de roupas íntimas, justamente as suas, continuavam ainda expostas escandalosamente naquele varal improvisado, bem em frente ao namorado, inclusive um sutiã encardido, tamanho extragrande. Mas, o pior ainda estava por vir. Não se sabe de onde surgiu aquela vaca de chifre enormes que teimava em comer os melões-de-são-caetano da cerca onde justamente estavam as pudendas peças e, mais precisamente, o tal tibuléu. Tanto fez a esgalamida vaca que, em uma de suas guinadas de cabeça, enganchou os chifres nas alças do sutiã, que foi arrancado da cerca, indo alojar-se exatamente no meio da cara do animal, formando um esquisitíssimo par de óculos Com aquela máscara cômica e improvisada, e sem nada enxergar, a vaca começou a correr sem rumo e nem prumo, a dar cabeçadas e a balançar a cabeça furiosamente, provocando um grande barulho com o chocalho, que logo despertou a curiosidade da criançada e, em pouco tempo, o terreiro era palco de uma divertida farra do boi, aliás, da vaca. Para piorar as coisas, o namorado da minha irmã entrou também na brincadeira e ofereceu-se para ajudar a vaca. Depois de muitas tentativas com um garrancho bem comprido, conseguiu, finalmente, arrancar o sutiã da cabeça da atormentada rês. Depois voltou-se para a minha irmã, e exibindo o estranho troféu ainda pendurado na ponta do garrancho, disse:

Eita! que a dona desse sutiã não tem peito, tem é uma bacia leiteira! Eu ia morrer de rir se ele fosse teu.

Um comentário:

Luciana Pinto disse...

Parabéns pelos textos e pela iniciativa! Espero começarmos uma grande parceria. Conte comigo!
Um grande abraço da madrinha!