sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Mentiras, mentirinhas, mentironas

Compadre 1 – Oi, compadre, tudo bem? Como vai ocê?
Compadre 2 – Tudo na santa paz, tudo nos conformes, compadre.
Compadre 1 - Como vão as coisas?
Compadre 2 – Vão indo como Deus quer e consente.
Compadre 1 - E comadre Zefinha, como vai? Melhorou da dor nas cadeiras?
Compadre 2 – Tá melhor, mas agora tá vazando pelo pito depois que andou comendo um tal de vatapá muito carregado na pimenta e no dendê, na casa de Rosinha Baiana. Se mete a comer essas comidas que não tá acostumada e dá nisso. Já tomou até chá de rosca, tampão e rolha de cortiça, e a hemorragia catingosa não quer estancar.
Compadre 1 – Um dia desses eu também tava com uma fininha que não tinha jeito de passar. Me arretei e tomei por minha conta duas colheres de sopa de cimento branco diluído em um copo dágua. Passei uns quinze dias com o fiofó lacrado, pedrado. Num passava nem vento. Tive que tomar um purgante de folha de carrapateira com umas gotinhas de óleo lubrificante e aos poucos fui voltando ao normal.
Compadre 2 – E aí, compadre, o que é que ocê tem feito da cintura prá cima?
Compadre 1 – Tô atualmente trabalhando na fazenda do deputado Zé Costa.
Compadre 2 – É verdade que a fazendo do homem é mesmo aloprada de grande?
Compadre 1 – Bota grande nisso, compadre! Prá ocê ter uma idéia do tamanho, basta dizer que pela planta da fazenda consta que ela tem cinco açudes, com 50 km quadrados cada um. A bicha é tão grande que tem um avião teco-teco que já faz uma semana que sobrevoa ela e ainda não avistou os açudes..
Compadre 2 – Vai ser grande assim no raio que o parta, sô! E o que é que ocê f az lá, compadre? .
Compadre 1 – Faço de tudo. Sou peão, capataz, vaqueiro, amansador, zelador...
Compadre 2 – Você deve ter muita história e causos interessantes prá contar, não é?
Compadre 1 – Um bocado...
Compadre 2 – Se não for pedir muito, dava prá você contar algum causo?
Compadre 1 – Eu não gosto muito de sair contando por aí as minhas histórias porque as pessoas ficam pensando que eu tô mentindo, tô inventando, tô exagerando, quando isso não é verdade, pois eu só digo a verdade e tenho raiva de quem não fala a verdade. Acho isso uma coisa muito feia. Mas, como é prá atender um pedido seu, compadre, vou contar um causo que aconteceu comigo na fazenda, coisa de um mês atrás.
Como você deve saber, eu sou um vaqueiro muito bom, experiente e nunca apanhei de nenhuma rês. Mas, nesse dia, tinha uma novilha fujona que tava dando um trabalho danado prá se juntar com o resto do gado. Desembestou por dentro da garrancheira, parecia que tava com o cão no couro. Aprumei o cavalo e saí em disparada atrás da bicha, abrindo caminho pelo mato seco cheio de garranchos, cipós e espinhos, até conseguir dominar a danada. Como já tava tarde, fui prá casa. Minha mulher quando me viu deu um grito de espanto. -Valha-me Santo Cristo do Ipojuca! O que é que houve com você, homem? Você tá só com um olho na cara!
Foi quando passai a mão no rosto melado de sangue, me olhei no espelho e vi que realmente eu tinha um olho e só o buraco do outro olho.
-Já sei o que aconteceu, disse eu para a minha mulher, um garrancho arrancou meu olho, eu tava com o sangue quente e não notei nada; e já fui montando no cavalo e dando meia volta em direção ao matagal onde eu tinha começado a perseguição da novilha.
Procurei, procurei o olho, e nada. De repente, avistei um caminho de formigas. Fui seguindo as formigas e quase não chego a tempo, porque elas iam carregando o meu olho e já estavam fazendo manobras prá entrar no formigueiro.Dei um bote , agarrei meu olho, bati ele numa pedra e assoprei as formigas, coloquei ele no lugar e tratei de voltar prá casa. Ficou tudo tão direitinho que a minha mulher nem notou nada. Graças a Deus tô até hoje com meu olho firme e enxergando tudo.
Compadre 2 – Compadre, essa eu mereço; por hoje tá bom até demais. Não precisa contar mais outro caso, não. Esse é brabo, mas eu consegui engolir. O que vai ser difícil é fazer a digestão.
Compadre 1 – Eu não disse que iam me chamar de mentiroso? Quando quiser ouvir outras historinhas procure outro besta pra contar, viu compadre? E se não conseguir fazer a digestão, tome um chazinho de bosta de cachorro. É tiro e queda.


José Oilton de Menezes
Julho/2009

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